Desde o início deste ano, os chamados ‘rolezinhos’ têm causado polêmica em todo o Brasil. Inicialmente, o movimento formado por uma grande quantidade de adolescentes tinha a intenção de protestar, principalmente em relação à segregação social. Hoje, para muitos, ainda não há explicação dos motivos pelos quais jovens da periferia, vestidos com roupas de marca, acabaram ganhando o noticiário nacional e até mesmo internacional.
Não se trata de negar que, principalmente no início deste ano, alguns movimentos, como o ocorrido no Shopping Itaquera em São Paulo, no dia 11 de janeiro, começaram pacíficos, mas terminaram em correria e confusão. Sabe-se que muitos jovens vão para os rolezinhos com a intenção de curtir e zoar, assim como de tentar enfrentar a polícia, querendo mostrar uma suposta superioridade. Porém, não se deve generalizar, porque na maioria das vezes essa é a ideia inicial que a população tem sobre o objetivo dos rolezinhos. Isso é confirmando por uma pesquisa feita e publicada em 23 de janeiro deste ano pelo site DataFolha, Instituto de Pesquisas. O resultado mostrou que a maioria dos paulistanos é contra a realização de rolezinhos em shoppings centers e acredita que o objetivo dos jovens que participam desses encontros é causar tumultos, e não buscar diversão. Independentemente do grau de informação sobre o tema, 82% dos paulistanos são contrários à realização dos rolezinhos. Entre os mais jovens, de 16 a 24 anos, o apoio à realização dos rolezinhos fica acima da média (18%), e cai conforme avança a idade dos entrevistados.
De certa maneira, esse resultado pode mostrar que não é coincidência o fato de a população jovem ser a que mais apoia a realização dos rolezinhos, pois a mesma, com experiência própria, pode compreender melhor que o entretenimento social apresenta deficiências em nosso país. Para o sociólogo Fred Lúcio, professor da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), os “rolezinhos” são uma continuação dos protestos de 2013. Assim como os protestos, os “rolezinhos” também não têm liderança. A diferença é que agora, em vez de transporte de qualidade, os jovens da nova classe média estão exigindo mais opções de lazer. “É um jovem com uma energia muito grande, com uma demanda reprimida por lazer, por diversão, por cultura, e que tem uma capacidade muito forte de mobilização”, diz o sociólogo.
Apesar de os rolezinhos serem uma polêmica ainda acentuada pela divergência entre vários pontos de vistas, o grande impacto causado por esses movimentos e a concepção do mesmo como uma “praga dos jovens nas ilhas de sossego da classe média” foram ocasionados, principalmente, porque o evento apagou a distinção entre o público e o privado, já que, ao contrário do que muitos dizem, o shopping é uma propriedade privada, aberta ao público em geral. Além do mais, no Brasil, a separação era automática, cada um de cada classe social sabia seu lugar. “Os Shoppings ofereciam a natural busca de conforto nos trópicos e a necessária proteção em uma sociedade violenta nas ruas, mas também a disfarçada segregação social que caracteriza o Brasil”, diz Cristovam Buarque para o site O Globo em 25 de Janeiro de 2014. Portanto, a partir do momento em que os rolezinhos, que são formados principalmente por jovens da periferia, começam a invadir o espaço que até então não “pertencia” a eles e que eles não frequentavam, propagam um sentimento repulsivo e de insegurança nos frequentadores costumeiros e nos trabalhadores do local, tirando sua “suposta” tranquilidade. Essas mesmas pessoas, baseadas em concepções muitas vezes preconceituosas, acabam tendo uma reação equivocada (e até desnecessária) em relação a esse movimento, e acabam sentindo a necessidade de chamar a polícia. Será mesmo que esses jovens ameaçam a segurança de consumidores e lojistas?
Para mim, os nomeados “rolezeiros”, que se reúnem nos centros comerciais, não são nada mais do que a consequência e o resultado de uma lógica capitalista imposta na sociedade, porque revelam, principalmente em países emergentes como o Brasil, que a desigualdade social é tão absurda a ponto de distanciar os componentes da classe dominante e da classe dominada de modo totalmente divergente. Por isso, quando um grupo componente da classe baixa frequenta um ambiente em que predomina a classe alta, os mesmos são tratados como ameaçadores e perturbadores da ordem social. Mas, na verdade, esses jovens, com atitude e de maneira ousada, podem muito bem ver no fato de terem o shopping, um lugar inicialmente de “burgueses”, como ponto de encontro de sua tribo e usar roupas de marca, uma maneira de se incluírem na sociedade.
“No meu modo de lidar com a situação, nada deve ser feito para impedir que os 'rolezinhos' aconteçam. Esqueçam liminares concedidas judicialmente e deixem de lado a ideia de selecionar quem pode ou não pode frequentar tal shopping.” Diz Bernardo Pinto, monitor no Centro de Exercício Jurídico da Newton Paiva (CEJU) e monitor da disciplina Teoria Geral do Processo, em declaração ao site JusBrasil. O fato é que a nova tribo dos “rolezeiros” veio para ficar, e essa é uma realidade com a qual teremos que aprender a conviver. Ou nos desprendemos das nossas raízes e conceitos mal elaborados de que periferia é sinônimo de marginalidade violenta, e um grupo de jovens pertencentes à mesma pode atrapalhar nosso passeio, ou continuaremos com essa visão fechada e individualista, desprezando o diferente e ignorando a situação do outro. Além de que os trabalhadores terão de se demitir do emprego no Shopping e os frequentadores, procurarem outro lugar para consumo.
Fonte: G1
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Por: Laura Nicoli
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